Imediatamente respondi para mim mesma. Não se vive por um que ou por um quem. Vive-se! Se precisássemos de um por que ou de um por quem , como sobreviveríamos as nossas tragédias pessoais, as nossas perdas... aos amores que se foram, aos filhos pequenos que não existem mais... Vivemos até que deixamos de viver. Simples assim. Como o vento venta até não ser mais vento. E a folha é até mais não ser. Como a poça d'água existe até se evaporar. Vivemos para que haja vida. Isso deveria nos bastar porque já é grande demais, misterioso demais.
Lembrei-me, então, da música Cajuína de Caetano Veloso, "Existirmos a que será que se destina?".
Sempre achei essa música linda, de uma melancolia infinita e intrigante. Fiz uma pesquisa no Google e não é que achei na "Rádio Moreno", em O Globo, Caetano falando sobre a música?!
Caetano conta que ao receber a notícia do suicídio de Torquato Neto, estava com Chico Buarque, em Salvador, para um show memorável que virou um disco famoso. Diz que ficou mal, mas não chorou.
"Senti uma dureza de ânimo dentro de mim. Me senti um tanto amargo e triste mas pouco sentimental. Quando, anos depois, encontrei Dr. Eli (pai de Torquato), que sempre foi uma pessoa adoráve, essa dureza
amarga se desfez. E eu chorei durante horas, sem parar. Dr. Eli me consolava, carinhosamente. Levou-me à sua casa. D. Salomé, a mãe de Torquato, estava
hospitalizada. Então ficamos só ele e eu na casa. Ele não dizia quase nada. Tirou uma rosa-menina do jardim e me deu. Me mostrou as muitas fotografias de Torquato distribuídas pelas paredes da casa. Serviu cajuína para nós dois. E bebemos lentamente. Durante todo o tempo eu chorava. Diferentemente do dia da morte de Torquato, eu não estava triste nem amargo. Era um sentimento terno e bom, amoroso, dirigido a Dr. Eli e a Torquato, à vida. Mas era intenso demais e eu chorei. No dia seguinte, já na próxima cidade da excursão, escrevi Cajuína.
"Existirmos a que será que se destina
Pois quando tu me deste a rosa pequenina
Vi que és um homem lindo e que se acaso a sina
Do menino infeliz não se nos ilumina
Tampouco turva-se a lágrima nordestina
Apenas a matéria vida era tão fina
E éramos olharmo-nos intacta retina
A cajuína cristalina em Teresina."
Torquato Neto - nasceu em Teresina, Piauí, em 09 de Novembro de 1944. Filho de promotor público e professora primária, estudou no mesmo colégio que Gilberto Gil, em Salvador, tornando-se amigo do compositor e conhecendo também os irmãos Caetano Veloso e Maria Bethânia.
Em 1962 mudou-se para o Rio de Janeiro, onde iniciou um curso de Jornalismo. Sem o diploma, começou a exercer a profissão em diversos jornais cariocas.
Clara Favilla
Quarta-feira, 05 de novembro de 2008
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