domingo, 15 de fevereiro de 2009

Existir, a que será que se destina?


Como imaginar passado o que aínda é tão recente?

O tempo nada mais é que uma abstração humana e passa de um jeito diferente conforme o nosso estado de espírito e a idade que temos. Para mim, que tenho 58 anos, passado refere-se a décadas. Para Bebel, que tem 24, a meses. Quando eu tinha 10 anos, achava que morreria com 70 anos sem completar 18, porque parecia uma eternidade a passagem de criança para jovem.

A Bebel escreve sobre o que lhe acontece na vida universitária , primeiro em Bruxelas e agora, em Haia. Isso funciona como um imã para eu escrever sobre a minha. Também fiz dois cursos completos. Letras e Jornalismo, os dois na Universidade de Brasília. Eu amava aquele campus, a biblioteca, primeiro a de madeira, depois aquele prédio lindo em frente à Reitoria. Vi construir os dois. E o Bandeijão... quando entrei na Unb, pela primeira vez, funcionava num barraco. Mas também aproveitei o prédio novo.

Uma das caminhadas mais felizes que eu fazia, nesse tempo, era da L2 Norte até o Minhocão, passando pelo Departamento de Música. Sempre tinha alguém exercitando algum instrumento, ou o canto. Se era ainda cedo para as aula, eu sentava no gramado e ficava ali ouvindo. Quantas apresentações assisti naquele pequeno auditório! Não só apresentação de alunos, mas também de futuros cantores e compositores de música popular que ficariam conhecidos: Fagner Pavão Misterioso e a turma do Ceará. Os irmãos Clodo, Climério e Clésio. Climério cantava tão gostosinho, músicas de bem humoradas, acentuando as palavras erradamente de propósito, como helicoptéro. O Clodo é outra história. Para ouví-lo cantar não precisa de show nenhum. Bastava eu me encontrar com a turma nas calçadas da 312 Norte, na casa da Valéria ou na de Dona Alice, mãe dele. E falando nisso, parece que nada passou, nem há 30 anos, nem há três meses. Tudo se passa agora, neste instante.

Quando o papa João Paulo II morreu, por curiosidade jornalistica dei uma lida em algumas de suas encíclicas. Numa delas, ele fala sobre a consagração do pão e vinho, o momento "mágico" da missa, quando transformam-se, pela fé, no próprio corpo de Cristo. Pois bem, um dos trechos mais lindos da encíclica diz que quando o celebrante em qualquer parte do mundo, seja na mais suntuosa basília ou na igreja mais humilde de uma aldeia, diz como Cristo na Última Ceia: "Façam isso em minha memória", não está apenas repetindo as palavras divinas, mas sendo o próprio Cristo. E, portanto, abrindo um espaço para que a eternidade aconteça naquele exato momento, neste plano terreno.

Eternidade está além das formas como existimos neste mundo. Mas há homens e mulheres que serão lembrados sempre e por, isso, alcançam a eternidade em vida. Michelangelo certamente tinha consciência de sua eternidade enquanto pintava a Capela Sistina. Eu ainda estou no patamar daquela pergunta em forma de poesia: Existir, a que será que se destina?"

Foto: www.tashian.com/carl/photos/d-orsay-clock.3.jpg

Clara Favilla

Domingo, Junho 01, 2008

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